Um dia negro | Miguel Sousa Tavares

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Há mínimos que gente como eu deve exigir a quem tem o poder de entrar por uma casa adentro às sete da manhã e virar uma vida ou um país do avesso

No jornalismo aprende-se a redigir as notícias começando-se por resumir o essencial numa frase de abertura, a que se chama lead. No caso de notícias pouco importantes ou relativamente a situações ou países pouco importantes, o lead é curto e directo ao assunto. Na imprensa internacional de referência, o que aconteceu quarta-feira em Portugal resumiu-se a um simples lead: “O Governo português — um dos raros na Europa de maioria absoluta — caiu na sequência de o primeiro-ministro e algumas pessoas do seu círculo próximo terem sido alvo de abertura de processos-crime por suspeitas de corrupção nos projectos relativos à transição energética do país.”

E assim, curto e grosso, o país viu-se sumariamente enxovalhado e na lista negra de lugares onde seja saudável e prudente investir. De caminho, também e para efeitos internos, interrompeu-se a meio uma legislatura de maioria absoluta, atirou-se ao lixo um Orçamento prestes a ser votado e várias medidas urgentes e úteis para as pessoas dele constantes, interromperam-se as inadiáveis negociações com os médicos e a reestruturação do SNS, paralisou-se a execução do PRR e lançou-se em Bruxelas a suspeita sobre a boa aplicação dos seus dinheiros, aplicou-se um golpe de consequências ainda imprevisíveis na política de transição energética essencial a um país sem petróleo, gás ou centrais nucleares, mais uma vez protelou-se a escolha sobre o novo aeroporto de Lisboa, deixou-se a gestão governamental suspensa num momento em que paira uma recessão no horizonte, soltou-se, ufano, o populismo e a descrença nas instituições no ano das celebrações do 25 de Abril e devolveu-se a praça a alternativas forçadas que não existiam por si há três dias.

 

Créditos: Expresso

TVSH 10/11/2023

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